Enfª Ana Eugênia Loyolla Hollanders
Estava de plantão numa certa noite quando fui chamada por uma das funcionárias de uma unidades de internação pois, uma senhora estava passando muito mal e não queria que fosse chamado o médico. Subi ao andar para avaliar a situação... (Trabalhando em hospitais muitas vezes temos a vida de uma pessoa em nossas mãos, cabendo a nós, da enfermagem, avaliar alterações e tomar decisões a tempo de salvar este paciente sob nossos cuidados. Chamar o médico para atender uma intercorrência é fundamental e temos que ter firmeza da necessidade deste chamado, pois muitas vezes solicitamos o plantonista do local de urgências - pronto socorro- para atender nas enfermarias, ficando este descoberto.)
Fui ao quarto desta paciente: senhora bem idosa, rosto marcado pelas muitas dificuldades da vida, face tranqüila, olhos abertos e serenos, custando respirar, mas a encontro com um belo sorriso em seus lábios ( já um pouco cianótico - azulado pela falta de ar), oxigênio sendo administrado em um cateter (tubo) nasal . Pego em sua mão fria, emagrecida, veias aparecendo, tendo um soro ali instalado e converso com ela:
- Boa noite, o que a senhora está sentindo ?
Com frases entrecortadas pela falta de ar, ela responde baixinho:
-Minha filha, não estou nada bem, sei disso, mas não quero que chamem o médico.
Questiono o porquê desta recusa e ela, falando tranquilamente, mas, com grande dificuldade responde:
- Minha filha, há anos tenho passado muitos dias e noites em hospitais, você vê alguém aqui comigo? Tenho 11 filhos...
(Olhei discretamente o quarto mais uma vez, pois já havia estado ali em vários outros plantões, e não vi, em nenhuma de minhas visitas algum acompanhante).
... e nenhum deles pode deixar sua casa e ficar aqui. Trabalhei muito minha vida toda lavando roupas para fora, para alimentá-los, vesti-los, dar a eles o estudo que não tive, meu corpo dói quando levanto, quando ando, e agora, quando respiro, está tão difícil...
Silenciou por breve momento, não tinhamos como falar nada, somente escutavamos.
E ela continuou, com dificuldade ainda maior
...Estou sempre sozinha, somente tenho a companhia de Deus e de vocês, anjos que me ajudam... Quero ir com Ele, para os braços d’Ele, estou muito cansada... por favor, não quero mais sofrer, quero descansar, respeitem isso... e fechou os olhos...
Minha funcionária chorava, eu custava segurar as lágrimas...
Deixamos a paciente o mais confortável e aquecida possível. Ela dormia...
Chamamos o plantonista... terminava nosso plantão...
Cheguei no plantão seguinte e não a encontrei em seu leito, o quarto estava vazio...
2 comentários:
Ana, lindo relato, só quando passamos por uma situação assim, compreendemos o quanto faz falta um pouco de carinho com essas pessoas que muitas vezes só querem um sorriso. Abraço Cintia Teixeira
E quantas vezes temos chance de fazer isso e nem sempre damos a atenção necessária... e é tão facíl, custa tão pouco e vale tanto !!!!
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