O CORONEL
Avenor A. Montandon
O Coronel João Bastião era um fazendeiro abastado, família grande e tradicional
na região. Era um sujeito enérgico cordial e muito caridoso.
No auge dos seus 60 anos aparentava uma saúde de ferro, demonstrada no cotidiano
pela disposição com que encarava a administração de seus bens: várias fazendas,
que percorria num jipe verde, vestindo um terno de linho cáqui. Seus filhos, já adultos,
o ajudavam nas tarefas de supervisão e controle do enorme patrimônio, mas nenhum deles
tinha o vigor e energia do pai.
Um belo dia o coronel ficou doente. Relutante, mas sob insistência da família,
procurou o médico, o Dr. César, competente e boa praça que gozava de muito prestígio
junto ao coronel.
Vários exames. Depois,veio a constatação da necessidade de uma intervenção cirúrgica:
- Coronel, o senhor vai ter que ser operado. - O Doutor foi categórico.
- Que isso doutor! Nunca tive nada, agora é que apareceu esse negócio de mijar fininho...
- Pois é coronel. Não tem remédio a não ser operação. Além do mais, a tendência é só
piorar. É também perigoso adiar a operação. Pode complicar.
O coronel coçou a cabeça, acendeu um cigarro de palha, encarou o doutor nos olhos:
- Precisa mesmo?
- Não tem jeito.
- Tudo bem, to nas mãos do senhor, que abaixo de Deus, tem sido bom para toda família.
A operação foi um sucesso mas era um tumor suspeito. Precavido o doutor encaminhou
a peça para exame. Uns quinze dias depois a constatação infeliz: era câncer.
Dr. César reuniu a família e abriu o jogo:
- O tumor é maligno, dos piores, a tendência daqui pra frente é piorar.
A família, constrangida, indagou se haveria algo mais a fazer
- Nada. Vamos aguardar. Ele vai passar bem nos próximos meses. Dito e feito.
O velho não teve nada e voltou à rotina normal. Seis meses depois, no entanto, o doutor
foi chamado. O coronel estava indisposto, amarelo e vomitava muito.
- Icterícia. pensou o doutor com seus botões. E daquelas que não tem jeito. Sem dúvida
o câncer se espalhou e já tomou o fígado.
Apesar dos remédios, o paciente piorava dia a dia. A família já pensava no inventário.
Um filho apossou-se de uma bota do coronel. Outro levou sua coleção de armas.
E, assim foram despojando o coronel dos seus pertences na expectativa de sua morte.
Um dia de manhã o velho manifestou a vontade de comer um lombo de porco com farofa.
A família chamou o doutor para opinar.
- Deixa ele comer. Afinal deve ser um de seus últimos desejos. E o coronel passou bem
para surpresa de todos. Noutro dia pediu uma feijoada. Queria assistir ao preparo da
refeição no rabo do fogão. Foi atendido e ainda deu palpites no tempero.
Dias e cardápios variados depois, o doutor saía do hospital, quando viu um homem de
terno cáqui e cigarro de palha na boca descendo de um jipe verde.
Era o próprio.
O Dr. César se aproximou perplexo:
- Uai, coronel. É o senhor?
- Em carne e osso, doutor. To novo!
- O que o senhor fez para melhorar assim tão depressa? - indagou.
- Deixei de tomar aquela remediada toda.
E viveu mais 28 anos.......!!!
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