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CONSIDERADO MORTO, HOJE VIVE E É FELIZ

sábado, 30 de junho de 2012


                                                                          Avenor A. Montandon

Quando iniciamos o primeiro contato com os doentes graves que acabavam de chegar ao hospital, notamos um deles com grandes fraturas na face, mas que no entanto, não apresentava quadro clínico que merecesse uma interferência imediata ou uma atenção especial por parte dos médicos que atendiam. Seus companheiros à morte, careciam de nossa rápida dedicação.
Saíamos de uma cirurgia, quando deparamos com o dantesco quadro. Aquele doente enfrentava a morte frente a frente. Havia aspirado sangue, sentia-se asfixiado e, em pouco tempo, seu coração não mais batia. Deixava de haver movimentos respiratórios.
Não fosse a violenta intervenção aplicada: a abertura da traquéia com simples tesoura, massagem cardíaca e afinal, reanimação cardio-respiratória, não teríamos hoje a oportunidade de conversar alegremente com o senhor João Ribeiro.


  Gente boa, humilde, empregado rural, criador de porcos e passarinhos, tocador de sanfona, cavaquinho e violão e infortunadamente, o idealizador daquela romaria a Aparecida do Norte, que tão tragicamente terminou extinguindo 6 dos seus integrantes e 3 outras vidas de carro, considerado responsável pelo fatídico acidente.
Não esperávamos que o Sr. João vivesse. Um colega o considerava morto clinicamente, apesar da reanimação. Os dias se passaram e os cuidados do dia-a-dia permitiram esse papo que tivemos num momento de folga do hospital, com o Sr. João:
- O Sr. está triste sô João?
O aceno de cabeça confirmava a interrogação. Sua voz saia fraca, pois a fístula na garganta impedia que todo o ar dos pulmões passasse pelas cordas vocais saindo pelo pescoço (local da intervenção cirúrgica) e o ar sibilava como se desperdiçasse a voz que ansiava sair.
- Fiquei sabeno que minha muié morreu... Num dianta chorá. Meu pai morreu, eu fiquei triste, mas conformei, a gente num vive pra sempre nesse mundo memo, né?
Minha mãe morreu. Morrero meus irmão. Eles num vorta mais, num dianta chorá... quero sarar e vortá pra casa. Num tem quem cuida dos porco, meus 2 cachorro e os passarinho que prezo muito. Tenho muita coisa lá em casa. - Continuava o Sô João, dando vazão à ânsia de falar (passara vários dias sem o fazer) - Tenho um rádio muito bão que custou uns 230 conto, uma sanfona de 80 baixo com 7 registro. Um cavaquinho e um violão vermeio. Ah! tenho 8 marrote.
- O que é marrote sô João?
- É leitão, dotô. Tenho 8, e uma porca que tá criano. Pra tratá tenho ainda 1 paiol de milho.
- O Sr. toca algum desses instrumentos?
- Toco tudo.
- Pelo jeito o senhor gosta muito de música, hein?
- Se gosto... gosto muito de jacó e jacozinho; Vieira e Vieirinha; Tonico e Tinoco, concluiu.
- Agora num tenho mais prazê em tocá. Sô desgostoso da vida. Quando chegá  lá vô vendê tudo!
E o sô João continuou, sem que o instigasse a falar:
- Alem do mais seu dotô; tenho muita ferramenta de carapina prá trabaiá, uma horta plantada por mim que tem de tudo quanto há: mandioca boa, cuzinha que só veno!
- E os passarinhos, sô João?
- Ah! Os passarinhos... tenho muitos; tenho um coleira, tenho um azulão, patativa, pintassilgo, tuim, passo preto e uma maritaca... vô sará logo pra tratá dos meus negócio lá.
Essa é a fortuna do Sr. João, gente boa, um desconhecido, até então para nós e que com a convivência se tornou tão íntimo e tão grande! Essa a fortuna e a felicidade do Sr. João. 
Ah! a felicidade, a oportunidade de ter devolvido a ele a vida simples. A oportunidade de voltar a tratar dos seus porcos e seus passarinhos...

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PALAVRAS FINAIS

Que bons ventos te tragam sempre...
e que bons ventos te levem...

mais leve, feliz,

tranquilo e

em paz!

Grande abraço!

Ana Eugênia


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